Estrangeiro em situação irregular com filho menor em situação regular 

A ocorrência dessa situação não é rara 

Basta um dos pais ter papéis e o outro pai ou mãe ilegal não querer (porque a vida a dois não é desejada) ou não poder (porque um dos dois é casado) fazer reagrupamento familiar com o pai ou a mãe que tem papéis. 

Nos termos atuais da lei sobre os estrangeiros, o pai ou a mãe de um menor estrangeiro que vive legalmente na Bélgica não pode invocar as disposições do reagrupamento familiar para viver com o seu descendente. 

Se tal possibilidade existe para os pais de um menor belga ou europeu, o mesmo não acontece com os os pais de um menor estrangeiro, que devem fazer um pedido de regularização por razões humanitárias com base no artido 9° – pedido de visto endereçado a um Consulado da Bélgica feito n – ou 9°bis da lei sobre os estrangeiros – pedido feito a partir do território belga, fazendo valer circunstâncias excepcionais. 

Esse tipo de regularização apresenta o grande inconveniente de não se pautar por critérios determinados por lei. Assim, ela depende da livre apreciação da administração, abrindo a porta para a arbitrariedade. 

O Serviço dos Estrangeiros (Office des étrangers) possui um documento interno que estabelece as condições para que o pai ou mãe ilegal de uma criança que vive legalmente na Bélgica possa ser regularizado(a). Segundo esse documento, a resposta da administração vai depender dos laços do pai ou mãe com a criança. O pai ou a mãe vive com a criança sob o mesmo teto? O  pai ou a mãe tem relações com a criança? Os pais estão separados? 

Os inconvenientes da prática atual são numerosos, principalmente do prisma do direito superior da criança e do direito de viver em família, este último protegido pelo artigo 8° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 

Na grande maioria das situações, o interesse superior da criança é evidentemente de poder viver junto com o seu pai e/ou a sua mãe e que este(a) tenha condições materiais e psicológicas que lhe permitam porporcionar uma boa educação ao seu filho. 

Nesse sentido, a situação atualmente em vigor é insatisfatória por vários motivos 

Em primero lugar, a nível da segurança jurídica. A ausência de critérios determinados por lei e o fato de as condições de concessão de uma autorização de residênca para um pai ou mãe ilegal de uma criança com papéis serem estipuladas por um documento interno geram falta de transparência e de segurança jurídica, favorecendo violações potenciais da obrigação de proteger o interesse superior da criança e o direito de viver em família. 

Segundo os critérios do Serviço dos Estrangeiros, o pai ou a mãe ilegal que não vive debaixo do mesmo teto que o filho deverá provar laços efetivos, materiais e afetivos com a criança para poder ser regularizado. 

A questão dos recursos financeiros, que é também de uma importância vital em matéria de reagrupamento familiar, só será abordada no momento da prolongação da autorização de residência. O risco de perda do direito de residência é grande se o pai ou a mãe que já tinha papéis depender da assistência pública (CPAS). 

Em segundo lugar, um pedido de regularização com base no artigo 9°bis da lei sobre os estrangeiros exige a demonstração de circunstâncias excepcionais que impedem o pai ou a mãe ilegal de retornar ao país de origem para pedir um visto. Na prática, a apreciação dessas circunstâncias fica totalmente ao critério do Serviço dos Estrangeiros, que costuma ser rigoroso, mesmo na presença de menores. 

Em terceiro lugar, o procedimento relativo a esse pedido de regularização também protege mal o interesse superior da criança e o direito de viver em família. Assim, o estrangeiro dificilmente poderá ter acesso ao procedimento sem a ajuda de um advogado, nenhum prazo é estipulado para que a autoridade tome uma decisão (na prática, pode levar mais de um ano) e o pedido está sujeito à taxa máxima de 366 EUR. O pior de tudo é a ausência total de autorização temporária de residência e de direito de trabalhar durante o processo, o que é totalmente contraditório com a proteção do interesse superior da criança. 

As associações que defendem os direitos dos estrangeiros empenham-se ativamente para que a legislação seja alterada no sentido de contemplar o reagrupamento familiar com menores estrangeiros não europeus, segundo critérios transparentes. 

Dra. Cecília Ronsse Nussenzveig  

Formada pela Faculdade de Direito da USP (São Paulo) em 1984. Obteve a equivalência do diploma pela Universidade Livre de Bruxelas (ULB) em 1996 

+32 02 646 39 30 

e-mail: nussen@brutele.be 

Avenue Louise, 207 – 1050 Bruxelas 

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