Quando descobrimos que alguém da nossa familia é usuário de droga, as nossas primeiras reações geralmente são de medo e preocupação. Os termos “droga”, “toxicomania” e “alcoolismo” têm conotações negativas que influenciam nossa maneira de pensar sobre as dependências. Historicamente, as dependências químicas têm sido vistas como um desvio moral ou falta de caráter. Todavia, a temática é extremamente complexa, tendo implicações neurológicas, psicológicas, sociais e culturais. Portanto, as dependências não devem ser reduzidas a uma questão apenas moral.
O que é uma substância psicoativa?
O que é considerado droga varia segundo a cultura. A terminologia atualmente utilizada para reunir todas as substâncias chamadas de drogas é substância psicoativa. Esse termo se refere a todas as substâncias que alteram a percepção, consciência ou funcionamento do indivíduo. O cigarro e o álcool, apesar de não serem considerados drogas na cultura ocidental, são substâncias psicoativas. O consumo de tais substâncias pode levar à dependência.
Mecanismos neurológicos e psicológicos da dependência
O circuito de recompensas é um sistema neurológico cuja função é de favorecer comportamentos indispensáveis à nossa sobrevivência. Ele proporciona a motivação necessária para a realização de ações ou comportamentos essenciais como beber, comer e se reproduzir. A execução dessas ações resulta em sensações agradáveis que incitam a reprodução dos comportamentos que trazem esse prazer.
Ao longo do tempo, o consumo habitual de substâncias psicoativas age diretamente no circuito de recompensas, associando a substância com o prazer. Chegando nesse ponto, o usuário se torna dependente da sensação induzida pela substância. Além do fenômeno neurológico, os aspectos psicológicos são fundamentais para a compreensão global da dependência.
O usuário geralmente procura o efeito da substância no intuito de diminuir alguma angústia. Paradoxalmente, o consumo dificulta o enfrentamento dos desafios cotidianos, potencializando o ressurgimento de ansiedades e angústias. Gradualmente, o consumo se torna a única fonte de prazer e estabelece um mecanismo escapista que distancia o usuário de sua realidade cotidiana.
A vivência do usuário é influenciada pela substância (modo de consumo, quantidade, propriedades farmacológicas, etc.), as características individuais (gênero, idade, composição genética, auto-estima, etc.) e características do meio social (normas culturais e familiares, situação socioeconômica, etc.). Considerando a complexidade das dependências, é fundamental quebrar com as crenças populares e adotar uma abordagem construtiva.
Atitudes contraproducentes
As atitudes do meio social e familiar têm um impacto crítico na instauração de uma dependência. Geralmente, o primeiro consumo é um ato de transgressão perante o qual os familiares tendem a rotular o indivíduo. Definido por adjetivos como “drogado”, “maconheiro”, etc., a pessoa começa a se se distanciar da família. O isolamento social leva o indivíduo a procurar grupos de usuários que legitimem a sua dependência. Dentro desses grupos, o indivíduo pode descobrir novas substâncias, como usá-las e como encontrá-las. A postura inicial da família pode consolidar o desenvolvimento da dependência.
O que fazer no âmbito familiar?
Existem diversos fatores individuais, familiares e sociais que protegem os jovens contra as dependências:
1) Disponibilidade e capacidade de escuta dos pais;
2) Vigilância parental sobre as companhias;
3) Regras familiares explícitas sobre o consumo de substâncias psicoativas;
4) Estimulação de uma imagem positiva de si e do corpo;
5) Estimulação da aprendizagem escolar;
6) Conduta exemplar diante dos filhos em caso de consumo de substâncias licitas (álcool e cigarro).
Porém, um meio escolar ou familiar permissivo, violências domésticas, dependências de um (ou ambos) dos pais e dificuldade no gerenciamento do stress e das emoções são fatores de risco correlacionados com futuras dependências.
Caso um dos seus próximos apresente sinais de dependência, a melhor atitude é o acolhimento e não o julgamento. Compreender os fatores sociais e pessoais que impactam o indivíduo ajuda a discernir os fundamentos da dependência. Esse primeiro passo pode facilitar o trabalho dos profissionais da saúde numa segunda intervenção.
As ONGs Infor Jeunes e Infor Drogues oferecem informações sobre diversos instrumentos para interromper o agravamento das dependências às substâncias psicoativas, seja através de medicamentos, psicoterapia, clínicas de reabilitação ou internações hospitalares.
Não negligencie a sua saúde mental nem a dos seus próximos!
Psicólogo Felipe Fernandes Patury