Não é fácil para as pessoas em situação irregular ou precária abrir uma conta bancária na Bélgica. No entanto, a lei prevê a obrigação para os bancos de fornecer um serviço bancário básico a todo consumidor “legalmente” presente na Bélgica que faz um pedido.
Por exemplo, uma brasileira tem um filho nascido na Bélgica cujo pai brasileiro possui um direito de residência. O filho terá o mesmo estatuto que o pai e será inscrito no seu endereço. A mãe sem documento não poderá receber os abonos de família nem as demais prestações familiares porque nenhum banco aceitará abrir uma conta para ela.
Embora essa recusa seja praticada por todas as instituições bancárias na Bélgica, trata-se de uma prática contrária à lei, pois essa mãe não está “ilegalmente” na Bélgica do ponto de vista da definição de consumidor dada pelo Código de Direito Econômico. Esse dispositivo legal prevê a obrigação para todos os estabelecimentos bancários de conceder a cada consumidor que reside legalmente num Estado-membro da União Europeia o direito de dispor de pelo menos um serviço bancário básico a fim de levar uma vida conforme à dignidade humana.
Segundo o Código de Direito Econômico, a definição de residência legal corresponde a três critérios:
• qualquer pessoa física que tenha o direito de residir num Estado-membro em virtude da legislação europeia ou nacional, inclusive os consumidores que não têm endereço fixo;
• os consumidores que não têm autorização de residência mas cuja expulsão é impossível por razões legais ou práticas e
• os requerentes de asilo político.
Essa definição abrangente de consumidor é conforme à legislação anti-discriminação, que proíbe distinções entre pessoas com base na nacionalidade.
Assim sendo, o banco que se recusa a abrir uma conta para essa mãe brasileira por motivo da sua não inscrição na Prefeitura está agindo contra as disposições do Código de Direito Econômico, pois ela não pode ser expulsa sendo que o filho menor dela reside na Bélgica. Ela tem direito, portanto, enquanto aguarda a regularização, a beneficiar de um serviço bancário básico.
Para fazer valer os seus direitos, escolha um dos bancos existentes na Bélgica e peça um formulário de abertura de uma conta bancária básica. Alguns bancos põem esse formulário à disposição pela Internet.
O banco dispõe de 10 dias úteis para responder ao pedido de abertura de uma conta básica após a entrega do formulário devidamente preenchido.
A pessoa deve poder provar a sua identidade (passaporte) e a sua residência (atestado de ajuda médica urgente do CPAS, conta de luz, etc.).
Segundo o Código, há três motivos legais para uma recusa:
• a pessoa já dispõe de um serviço bancário ou de uma conta corrente, mesmo que num outro banco;
• a pessoa já tem empréstimos totalizando 6.000 €;
• a pessoa cometeu um estelionato, um abuso de confiança, uma falência fraudulenta, uma falsificação ou lavagem de dinheiro.
Em conformidade com a lei relativa à prevenção da lavagem de dinheiro, o banco deve recolher as informações seguintes: nome completo, local e data de nascimento e, na medida do possível, o seu endereço. A pessoa deve poder provar através de documentos as informações fornecidas.
Se apesar de a pessoa fornecer todas as informações devidamente comprovadas por documentos oficiais, o banco persistir na recusa, cabe em primeira instância um recurso ao serviço de queixas interno do banco.
A resposta do órgão interno do banco chega no prazo de 10 dias. Em caso de acordo, o consumidor é convidado a se apresentar ao guichê do banco. Em caso de recusa, será necessário fazer uma queixa para um organismo externo, o Ombudsfin.
Apesar de as queixas geralmente serem aceitas, os bancos continuam a recusar a abertura de conta.
Depois de a conta ser aberta, começa uma outra batalha: os bancos em geral recusam-se a fornecer um cartão. A única solução é recomeçar todo o circuito das queixas.
Dra. Cecília Ronsse Nussenzveig